INQUÉRITO DE MORAES É ALGO JAMAIS VISTO NA HISTÓRIA DESTE PAÍS.
Ainda que a grande imprensa não tenha se manifestado contra as arbitrariedades do STF, neste e em outros casos, o jornalista Jose Roberto Guzzo, nos brinda com um texto que mostra coragem e discernimento. Por concordar, divido-o com os amigos da coluna.
Fala Guzzo:
Envolvidos não são acusados
oficialmente de nenhum crime previsto nos 341 artigos do Código Penal. Na
verdade, nem sabem o que são. Suspeitos? Indiciados? Réus?
· No arrastão que vem fazendo há tempos contra fabricantes de notícias
falsas, inimigos das instituições e outros indesejáveis da vida política
nacional, o ministro Alexandre de Moraes tem incluído, desde
o início, uma penca de parlamentares em pleno exercício de seus mandatos; só no
último rapa, no começo desta semana, decidiu quebrar o sigilo bancário de dez deputados e um senador,
e mandou a Polícia Federal apreender objetos de propriedade de
um outro. Pode, isso? Pode, porque Moraes diz que sua investigação é legal, e
se os seus colegas acharem que é legal, a coisa toda fica legal, seja lá o que
for – é assim que funciona e é assim que o STF entende que
deve ser praticada a democracia no Brasil de hoje. (O ministro Edson
Fachin já decidiu que está tudo certo com a operação de Moraes; o
plenário ainda tem de dar a palavra final, mas quem pode duvidar do
resultado?).
O inquérito de Moraes é algo jamais
visto na história deste País. É um procedimento secreto; nem o público, nem os
investigados e nem mesmo os seus advogados têm acesso à papelada legal da
operação. Os envolvidos não são acusados oficialmente de nenhum crime previsto
nos 341 artigos do Código Penal. Na verdade, nem sabem o que são.
Suspeitos? Indiciados? Réus? O Ministério Público, que tanto quanto se saiba é
quem tem a exclusividade de fazer investigações criminais no Brasil, não
participa de nada disso.
O STF, enfim, apresenta-se como vítima, polícia, promotor e juiz no
mesmo caso – está dizendo, ao que parece, que só ele, STF, tem o direito de
investigar os delitos que o atingem e, no fim, de julgar quem é culpado e quem
não é.
No ambiente de
anarquia legal em que o Brasil se acostumou a viver nos últimos anos, onde a
lei não é o que está escrito, mas o que os tribunais dizem que é, nada disso é
realmente uma surpresa. Mas chama atenção, em todo caso, a passividade com que
o Congresso Nacional aceita que os seus membros sejam tratados como bandidos
vulgares por um outro Poder da República. O ministro Moraes confisca bens dos
deputados e manda que eles apareçam na polícia para depor. As mesas da Câmara
Federal e do Senado não dão um pio. Os deputados obedecem quietinhos às ordens
que recebem. Ninguém iria aceitar se fosse o Executivo que fizesse isso. Mas
como é “o Supremo”, todo mundo acha que não há problema nenhum.
Não há dois tipos de deputados – os que
estão sob a proteção das leis, porque o STF aprova a sua atuação política, e os
que não estão, porque incomodam os ministros da corte. Mas é exatamente esta
situação que vem sendo aceita no Brasil. Quando a imprensa senta a pua no
Congresso e nos congressistas – e tudo o que pode fazer é isso, falar – é
imediatamente acusada de “criminalizar” a política e agredir a sagrada
majestade do Legislativo.
O ministro Moraes pode fazer o que bem lhe dá na
telha e ninguém acha nada de errado nisso. Os deputados podem estar dizendo coisas
horríveis do STF; em matéria de má conduta, não estarão fazendo nada de
diferente do que fazem cerca de 200 parlamentares acusados na Justiça por
crimes que vão do estelionato ao assédio sexual, conforme o Estado de
S. Paulo divulgou em levantamento sobre o atual Congresso publicado em
2018. O STF jamais deu a mínima para essa aberração, e ninguém considera que
haja aí qualquer desrespeito à democracia.
É claro que não existe nenhuma possibilidade de se levar a sério o show
ora em cartaz.
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