QUEM É O INIMIGO.
.
No Brasil, o inimigo é quem defende um ponto de vista
diferente do seu
A única arma contra a peste é a
honestidade.
Albert Camus, em A
Peste
Eis aí o que mais
está faltando ao Brasil destes tempos de epidemia, morte e miséria. Há gestores
que não acabam mais – um em cada esquina, do Oiapoque ao Chuí. Há a
multiplicação geométrica de palpites que se transformam em decisão de governo.
Há autoridades que querem acabar com o vírus produzindo feriados, filas de
ônibus ou congestionamentos de trânsito. Rodízios de carro são feitos,
desfeitos e refeitos; a única certeza que deixam é de que as autoridades que
decidem sobre eles não têm ideia do que estão fazendo. A cada meia hora aparece
alguma nova facção obcecada em defender alguma coisa, ou em guerrear contra ela
– da cloroquina à proibição da abertura dos armarinhos. Mas a coragem de
assumir posições honestas está desaparecida há três meses no Brasil.
Nunca foi muito presente. Hoje em dia, sumiu de
vez. Entra de tudo neste cozido. O público teve direto, inclusive, a uma declaração
realmente extraordinária do ex-presidente Lula, que se juntou à multidão de celebridades com
algum manifesto essencial a lançar sobre a covid-19. “Ainda bem que a natureza,
contra a vontade da humanidade, criou esse monstro chamado coronavírus”, disse
Lula. O lado bom da tragédia, segundo ele, seria o efeito didático do vírus.
“Esse monstro está permitindo que os cegos comecem a enxergar que apenas o
Estado é capaz de dar solução a determinadas crises”, disse Lula. Que solução?
Se a covid está provando alguma coisa nesse país, é justamente a incapacidade
terminal do Estado em lidar com o problema. Basta olhar para a lista de mortos
que cresce desde março – ou o que acontece dentro dos hospitais públicos onde a
epidemia é tratada.
E a roubalheira,
então? A primeira consequência da majestade do “Estado” perante a covid foi a
suspensão das licitações públicas para despesas relacionadas com o combate ao
vírus; a partir daí, rouba-se com inédita ousadia em todos os Estados e 5.500
municípios, sem que o Ministério Público incomode realmente ninguém.
Mas é nisso mesmo que
está a verdadeira alma do atual debate: a realidade que vá para o diabo. A
única coisa que interessa é aproveitar o vírus para vender o seu peixe
ideológico, político ou financeiro.
A população
brasileira precisa, mais do que nunca, de uma trégua; só então se abriria mais
espaço para a competência, a eficácia e a seriedade científica no trato da
calamidade que está arruinando o País. Mas nenhuma trégua será possível sem
honestidade – mesmo com todas as declarações de bons propósitos como as que
foram feitas outro dia pelo presidente da República, os 27 governadores e os
presidentes do Senado e da Câmara, em sua reunião virtual. O problema real é
que os políticos – e milhões de cidadãos – acham que hoje só existe um tipo de
fato: o que confirma as suas próprias opiniões, crenças ou convicções sobre a
epidemia. Mas não é assim. Há fatos independentes entre si que convivem ao
mesmo tempo; a existência de um não anula a existência de outro. O medo de
morrer é um fato que está acima de dúvida. O medo de ficar sem dinheiro para
sobreviver é outro, do mesmo tamanho.
Na maioria dos países
do mundo há um inimigo comum – o vírus. No Brasil, o inimigo é quem defende um
ponto de vista diferente do seu. O resultado é essa aberração que está aí, na
qual o confinamento deixou de ser um meio para combater a epidemia e se
transformou numa meta política que divide o poder público em dois campos
opostos. É o ideal para fazer o que estão fazendo: matar cada vez mais gente e,
ao mesmo tempo, destruir o País.
Por Jose Roberto Guzzo:
Poderia ter sido incluída a MP que isenta os gestores públicos de "erros" na aplicação do dinheiro público. Servirá apenas para estimular os ladrões de plantão.
ResponderExcluir