O Valor Econômico noticiou na semana passada que a
desigualdade de renda no Brasil parou de piorar no 3º trimestre de 2019
após quatro anos de piora continua segundo medição da Escola Brasileira de
Economia e Finanças da GV com base nos dados recém divulgados da Pesquisa
Nacional por Amostra de Domicílio (PNAD) do IBGE. A explicação parece estar
no re-emprego de 1.533.000 desempregados, ainda que a maioria deles com
empregos informais de 2018 para cá.
A concentração da renda é a doença planetária desta transição entre
milênios que promete tempos tempestuosos para a democracia em todo o mundo.
Nem mesmo a americana, único regime na historia da humanidade que desde a
virada do século 19 para o 20 vinha sendo regido pela baliza “antitruste”,
a da defesa da concorrência, pressuposto da liberdade que cada ser humano
só pode exercer nas suas dimensões de consumidor e trabalhador neste nosso
mundo economicamente orientado, escapa ao tsunami mundial
de fusões e aquisições de empresas que bate recordes sucessivos ha mais de
30 anos desencadeado pela concorrência predatória dos monopólios sem lei
nem limite do “capitalismo de estado” chinês, o novo nome da velha ordem
socialista onde ha um só patrão e um só proprietário de todos os meios de
produção.

A diferença é que no Brasil, que
também não escapou à hecatombe planetária do pequeno empreendimento, o
processo de concentração da renda deu-se predominantemente “no tapetão”, em
função do avanço avassalador das corporações de “servidores” do estado
sobre o PIB na “Era PT” mediante a imposição de aumentos sucessivos de
salários e outras formas disfarçadas de remuneração muito acima da
inflação.
Combinadas a estagnação do investimento publico que custou esse
processo maciço de transferência direta de renda das classes pobre e média
para a privilegiatura com o consequente sucateamento da infraestrutura, da
educação, da saude e da segurança publicas, foram simplesmente suprimidas
as condições essenciais para o resgate dos miseráveis da miséria.
Na China, partindo de abaixo de zero, o processo foi de forte
crescimento econômico com reforma geral da infraestrutura física e
tecnológica e enorme ganho de poder de concorrência global. Nos EUA e
outras economias avançadas as perdas deram-se ao menos concomitantemente
com ganhos de produtividade e forte investimento na infraestrutura
científica e tecnológica. Mas no Brasil houve perdas por todos os lados que
se meça. A única exceção foi o padrão de vida da privilegiatura que hoje
desfruta de remuneração 36 vezes maior que a do resto do país computados
apenas os ganhos nominais e da “petrificação” de todos os seus outros
privilégios, da impunidade às taxas de juros especiais, por cima do maior
de todos que é a dispensa de competir por um lugar ao sol e apresentar
resultados para manter empregos.
Pobreza - hoje não ha mais espaço
para dúvidas quanto a isso - não existe por si, é exclusivamente
consequência de instituições políticas dolosamente iníquas. O Japão é uma
ilha de pedra que mal tem água que se possa beber por cima e nada de valor
por baixo do solo, e está lá como prova do que pode fazer por um povo a
adoção de instituições copiadas do mundo que funciona. O Brasil só chegará
“lá” quando fizer a mesma coisa, começando por excluir de sua constituição
tudo que não diga respeito a todos os brasileiros, sem nenhuma exceção, e
por “despetrificá-la” para transformá-la do congelador de privilégios que é
hoje num instrumento de facilitação de mudanças dentro de normas
democráticas.
Mas para poder partir para isso tem de chegar vivo à altura de
fazê-lo, o que requer umas poucas reformas que ficariam melhor descritas
como “manobras de ressuscitação” de um organismo econômico em coma. A
chamada reforma administrativa é a mais urgente delas. Sem a privilegiatura
devolver um pouco do que nos tomou não saímos da UTI. E a que está proposta
para o Brasil é até tímida, ainda que inclua um componente
pré-revolucionário. Ela não vai longe o bastante para pedir o fim da
irrestrita estabilidade no emprego do funcionalismo que está na raiz de
todos os vícios que estão matando o Brasil. Propõe apenas
“desautomatiza-la”; desliga-la da “relação de sangue”; desatrela-la do
simples pertencimento à casta para liga-la remotamente ao mérito e ao
desempenho, ao condiciona-la a um período de três anos como trainee do
candidato a funcionário estável seguidos de avaliação, ainda que da casta
pela casta, e à existência de vaga no serviço público e não apenas da
disposição de algum padrinho de aumentar seu rebanho particular.
Nem isso passou da soleira da
porta, porém. Como sempre não por interferência de uma oposição formal ao
governo, mas por determinação do próprio presidente da República, ele, como
todos, um membro da privilegiatura de cujas prerrogativas a mais corrosiva
é a de deter o monopólio do acesso à politica. É esta que, nunca é demais
lembrar, mantem o divisor de águas do Brasil na
barreira vertical do feudalismo - nobreza contra plebeus - e não no da
divisão horizontal da democracia à qual nunca ascendemos - esquerda contra
direita - como a massa distraída dos otários é levada pela privilegiatura a
acreditar.
O estado de direito não é essa (des)ordem institucional que está
estabelecida porque nos foi imposta. É um ideal, um devir que se define por
tudo que está ausente dela: igualdade perante a lei, um homem um voto,
fidelidade da representação do País Real no País Oficial, hegemonia do
povo, etc.
Que a privilegiatura use todos os meios para continuar desfrutando
seus privilégios compreende-se. Mas ao endossar o critério de “orientação
pela proximidade” que faz os políticos deduzirem pela apalpação do “rabo” a
figura do elefante da “impopularidade” e invocar o “estado de direito” como
definido pela privilegiatura sempre que alguém tenta empurrar-nos para o
verdadeiro, a imprensa nega ao Brasil a chave da libertação dessa servidão.
Ja passou da hora da que se pretende democrática expulsar esses vendilhões
do templo.
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